É na Constituição que reside, primariamente, o “estatuto jurídico dos congressistas.”
Entre as prerrogativas outorgadas aos membros do Congresso Nacional, destaca-se a possibilidade de o Parlamento suspender o curso de processo criminal contra Deputado Federal ou Senador da República, instaurado, uma vez recebida a denúncia, por suposta prática de infração penal cometida após a diplomação do congressista.
É o que dispõe o art. 53 , $ 3o., da Carta Política. Essa cláusula constitucional, introduzida pela EC 35/2001, tem por finalidade resguardar a independência do Poder Legislativo e proteger o congressista no exercício de seu mandato parlamentar.
Trata-se de regra de direito estrito, seja em função de sua literalidade textual, seja, ainda, em razão de sua teleologia!
Isso significa, portanto, que a referida cláusula constitucional somente incide para proteger o parlamentar (e este, apenas), não se estendendo a terceiros que, embora figurem como litisconsortes penais passivos (corréus) na mesma causa instaurada contra o congressista, não ostentem a condição jurídica de membros do Poder Legislativo!
É, na realidade, a mesma razão de ordem jurídico-constitucional que impede o corréu não parlamentar de postular a extensão, a ele, do instituto da imunidade parlamentar de que goze o seu litisconsorte membro do Poder Legislativo.
Esse foi o entendimento que o STF consagrou há décadas, em enunciado sumular formulado em 13/12/1963 : “A imunidade parlamentar não se estende ao corréu sem essa prerrogativa.”(Súmula 245).
Aplica-se, desse modo, à cláusula constitucional que permite ao Parlamento suspender o curso da persecução penal o princípio da intranscendência, pois tal providência, que tem natureza excepcional (eis que importa em ingerência do Legislativo na esfera do Judiciário), traduz medida de caráter estritamente pessoal, a significar que a deliberação suspensiva de qualquer das Casas do Congresso Nacional não pode transcender, vale dizer, não pode ter por destinatário quem não se qualifique como congressista, ainda que figure como corréu do parlamentar na causa criminal .
Em suma: a Resolução n. 18/2025 da Câmara dos Deputados só se aplica ao Deputado Ramagem e, mesmo assim, alcança, unicamente, os delitos alegadamente por ele cometidos após sua diplomação eleitoral, vale dizer, abrange apenas os crimes de dano qualificado e de deterioração de patrimônio tombado.
Cabe observar, ainda, quanto ao Deputado Ramagem e aos 02 delitos por ele supostamente teria praticado após a diplomação, que a sustação do processo em causa suspenderá a prescrição penal referente a tais delitos, enquanto durar o seu mandato (CF, art. 53, $ 5o.).
Quanto aos outros litisconsortes penais passivos (Bolsonaro, seus generais e demais corréus), a Resolução n. 18/2025 da Câmara dos Deputados, que se projetou “ultra vires”, não tem qualquer eficácia jurídica, a significar que o processo penal instaurado contra todos eles deverá ter normal prosseguimento perante o Supremo Tribunal Federal !
É que tal Resolução se mostra, em relação a esses corréus, absolutamente ineficaz e, portanto, inaplicável !
CELSO DE MELLO, Ministro aposentado e ex-Presidente do Supremo Tribunal Federal
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