Por Anderson Costa
O presente texto analisa as vantagens e desvantagens do uso de câmeras corporais por policiais brasileiros, considerando o contexto de decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) que obrigam sua implementação em determinadas circunstâncias operacionais nos Estados do Rio de Janeiro (ADPF 635/2019) e São Paulo (SL 1.696/SP, 2024). A crescente adoção dessas tecnologias exige reflexão sobre seus impactos na atuação policial, na transparência institucional e na relação com a sociedade.
O uso de câmeras corporais tem se expandido no mundo como estratégia de transparência e responsabilização no policiamento. No Brasil, embora testes remontem à década de 1960, os avanços tecnológicos recentes viabilizaram a adoção prática desses dispositivos, que passaram a ser implementados em estados como o Distrito Federal, Santa Catarina, São Paulo e Rio de Janeiro.
A principal vantagem do uso das câmeras é sua capacidade de documentar de maneira objetiva as interações entre policiais e civis. Isso contribui para a produção de provas mais confiáveis em processos criminais, além de funcionar como instrumento de controle e fiscalização da atividade policial. Estudos, como os de Monteiro et al. (2022) e Silva e Campos (2015), apontam para uma redução significativa nos casos de uso excessivo da força após a adoção das câmeras, além da melhora na relação entre polícia e comunidade.
Outro benefício relatado é o efeito dissuasivo das câmeras, influenciando o comportamento dos agentes de segurança, que tendem a agir com mais cautela quando sabem que estão sendo gravados. Isso também aumenta a confiança da população, que se sente mais segura para colaborar com autoridades, além de proteger os próprios policiais contra acusações infundadas.
Apesar desses pontos positivos, há desafios importantes. Um dos principais diz respeito à privacidade dos cidadãos, especialmente em comunidades vulneráveis, onde o uso das câmeras pode ser percebido como forma de vigilância excessiva. A coleta de imagens sem consentimento pode gerar desconforto e receio, alimentando desconfiança em relação às autoridades.
Outro entrave é a falta de regulamentação padronizada sobre o armazenamento e o acesso às imagens. A ausência de normas claras pode gerar o uso indevido dos registros, violações de privacidade, perda ou adulteração de provas. Há também o risco de manipulação por parte dos próprios policiais, que podem desligar ou posicionar as câmeras de forma a omitir comportamentos inadequados.
A implantação em larga escala exige investimentos elevados, o que representa um desafio logístico e financeiro para os estados. Estima-se que mais de 800 mil profissionais da segurança pública poderiam ser contemplados com a medida, o que demanda planejamento orçamentário e capacitação técnica.
Em resposta a essas questões, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) emitiu, em janeiro de 2024, uma recomendação para padronizar o uso das câmeras corporais no país. Entre os pontos destacados, está a obrigatoriedade de gravação ininterrupta durante o turno de serviço, bem como a garantia de acesso às imagens por partes interessadas, inclusive por cidadãos abordados e policiais acusados de abuso.
A decisão do STF de tornar obrigatório o uso de câmeras em situações de maior risco representa um marco importante na tentativa de modernizar e humanizar a segurança pública brasileira. Ao exigir transparência e prestação de contas, essas medidas fortalecem o Estado Democrático de Direito, ampliando a proteção tanto dos cidadãos quanto dos servidores públicos.
Em síntese, o uso de câmeras corporais por policiais no Brasil é uma prática promissora, mas que deve ser conduzida com responsabilidade e rigor técnico. Seus benefícios – como transparência, responsabilização, melhoria na coleta de provas e proteção mútua – são evidentes, mas não podem ser alcançados plenamente sem políticas públicas consistentes, regulação adequada, investimento contínuo e fiscalização efetiva. Assim, trata-se de uma ferramenta com grande potencial para transformar a segurança pública, desde que inserida em um contexto de respeito aos direitos fundamentais e à legalidade.

Anderson Costa, é advogado criminalista, especialista em penal e processo penal. Mestre, autor e professor universitário e de concursos. Conselheiro Seccional na OAB/DF, Presidente da Comissão de Processo Penal da OAB/DF e Secretário Adjunto da Comissão Nacional do Tribunal do Júri.